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Happy pizza: a história mais engraçada

Sabe aquela história que você adora contar para as pessoas? Essa é uma delas. Na estrada sempre acontece uma cena engraçada, mas essa conseguiu superar todas as outras. Nunca imaginei que uma “simples pizza” pudesse ser fonte de tantos acontecimentos e motivo daquelas risadas de fazer chorar e a barriga doer. Na verdade a pizza não era simples assim e isso foi o que causou toda a história.

Tudo começa no ônibus de Bangkok, na Tailândia, para Siem Reap, no Camboja. Em uma das paradas para esticar as penas e para alegria dos fumantes (que não é o meu caso) conheci a Ryoko e começamos a conversar. Coisa de mulher fazer amizade na fila do banheiro, né? Ela morava em Bangkok, seu visto de permanência no país estava vencendo e a forma de renová-lo é sair do país e entrar de novo. Aproveitando a oportunidade, ela decidiu conhecer um pouco mais da cultura khmer.

Eu havia escutado histórias terríveis sobre essa travessia de fronteiras e fiz um milhão de pesquisas antes de decidir como a faria. A Ryoko definiu tudo em cima da hora (ela tinha esquecido a data de vencimento do visto dela) e tudo que ela sabia é que tinha que pagar uma taxa em dólar para conseguir o visto do Camboja. Ela me perguntou se eu sabia como funcionada toda essa burocracia e eu disse que sim, então ela grudou em mim o caminho todo.

Chegamos em Siem Reap embaixo de chuva e já estava escuro. Ela me perguntou se eu tinha lugar para ficar, porque ela não sabia para onde ir. Disse que tinha um hostel reservado e que ela podia ir comigo ver se eles tinham uma cama livre, caso contrário na região ela iria encontrar algo, pois era bem central. Ficamos em um quarto para 10 pessoas só para gente, por alguns minutos. Logo começaram a chegar outros hóspedes.

O primeiro que chegou foi o Shin, mais um japonês. Super engraçado e amante do futebol, fez questão de me mostrar que ele tinha uma camisa da seleção brasileira na mala. Logo em seguida chegaram 3 australianas super animadas e jovens (com os seus 17 ou 18 anos) que estavam curtindo seu schoolies, um período de viagem após o término do high-school e que antecede a fase de ingresso nas faculdades. Elas trabalharam durante algum tempo como garçonete, sempre conciliando os estudos, para juntar dinheiro para essa viagem de 3 ou 4 meses pelo sudeste asiático. A Austrália é demais, não é? Uma sociedade que incentiva os jovens a se jogarem no mundo de forma consciente merece a minha admiração.

No dia seguinte o Shin já havia agendado o small cycle para conhecer os templos de Angkor Wat e eu e a Ryoko tivemos uma manhã tranquila e sem planos. Tomando café da manhã, conhecemos a Wei, uma inglesa super fofa, e fechamos nosso passeio para o small cycle na manhã do dia seguinte. O Shin voltou a tempo de almoçar com a gente e na sequência fomos para o Blossom Café, muito bem recomendado no Trip Advisor, onde eu comi o melhor cupcake da minha vida!

Camboja_blossom cafe
O melhor cupcake da minha vida foi em Siem Reap, Camboja

De volta ao quarto do hostel, tínhamos uma nova vizinha de cama: a Morgan, uma americana muito gente boa que dava aula de inglês na Coréia do Sul e estava aproveitando para conhecer a Ásia. Ficamos um tempão conversando e planejando o que fazer no dia seguinte. Eu, a Ryoko e a Wei iríamos para o small cycle, a Morgan não estava muito afim de acordar às 4h da manhã e decidiu fazer alguma coisa com o Shin (ele já tinha feito o tour que iríamos fazer). Saímos para jantar, mas a Morgan disse que estava muito cansada e não quis ir.

Na manhã seguinte fomos as 3 ver o sol nascer por trás do Angkor Wat. Incrível! Assim como os outros templos que conhecemos. Voltamos para o hostel e algum tempo depois entram o Shin e a Morgan no quarto. Ele falando nada com nada e ela toda preocupada. O que havia acontecido com o Shin?

Senta que lá vem história…

 

Eles decidiram por fazer o grand cycle naquele dia. Em um determinado momento o Shin disse:

– Estou com fome.

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– Eu tenho 3 pedaços de pizza aqui que não comi ontem. Você quer?

– Eu quero!

– Mas é happy pizza, tudo bem?

– Tudo bem. Eu estou com fome e quero comer pizza.

– Você sabe o que é happy pizza?

– Happy pizza me faz feliz! (happy pizza makes me happy!)

 

Se você está se perguntando que diabos é essa happy pizza, eu te explico: é pizza com maconha. A Morgan queria ter certeza que o Shin sabia o que estava comendo, mas o inglês dele não era dos melhores. A resposta foi ingênua e com duplo sentido. Ele disse que ia ficar feliz por não sentir mais fome, ela entendeu que ele ia ficar feliz porque sabia dos efeitos da maconha. Ele comeu os 3 pedaços de pizza sem saber o que era e a nossa piada pelos próximos dias estava feita. Aqui vale ressaltar que o Shin é o tipo de cara super saudável, esportista, não fuma e não bebe, sem dizer que drogas são proibidas no Japão e ele nunca havia tido contato com nenhuma delas.

Depois de pouco tempo o Shin começo a sentir os efeitos:

– Estou me sentindo estranho

– É a pizza

– É… eu acho que essa pizza de ontem não estava boa

– O que você está sentindo?

– Parece que eu estou voando!

– É a happy pizza

– Happy pizza me deixou infeliz (happy pizza made me unhappy)

 

Eles visitaram 4 templos naquele dia. No primeiro o Shin estava bem, no segundo estava voando, o terceiro ele não lembra de nada (mas tem fotos) e o quarto ele decidiu não ir e ficar esperando a Morgan dentro do tuk-tuk (tuk-tuk é o transporte que te leva da cidade para o complexo de templos e de um templo para o outro). Nesse momento em que estava sozinho esperando ele achou que ia morrer, então pegou o celular e começou a gravar vídeos, pois caso alguém encontrasse seu corpo saberia o que fazer. Ele nos mostrou o vídeo depois e dizia algo como “se alguém me encontrar me leve de volta para o Japão, eu queria ter voltado vivo para casa”.

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Ta Phrom, um dos templos do complexo de Angkor Wat

Eles voltaram para o hostel e o Shin entrou dizendo que estava morrendo. O mocinho da recepção falava inglês e japonês (além do idioma local) e perguntou para Morgan o que estava acontecendo. Foi quando o Shin entendeu que tinha consumido drogas e por isso estava assim. E a Morgan só percebeu nesse momento que ele não tinha entendido o que era happy pizza.

O Shin estava engraçadíssimo e a Morgan se sentindo super culpada por ter feito o menino consumir maconha sem saber e passar mal o dia todo. Ele comeu dois potes de batata (tipo Pringles) que eram das australianas, dormiu por umas 18 horas e acordou bem no dia seguinte.

A Morgan nos explicou a história da pizza. Quando ela disse que ia para Siem Reap, alguns amigos comentaram da pizza e disseram que ela tinha que provar. Ela chegou, deixou as malas no hostel e foi procurar o lugar sozinha. Pediu uma pizza inteira só para ela, comeu 5 pedaços e levou os outros 3 para viagem (que foram os que ela deu para o Shin depois). Não era seu primeiro contato com drogas e ela não imaginou que fosse ficar mal. “Eu não estavam e sentindo bem, mas tinha acabado de conhecer vocês e não sabia o que falar. Vocês iam achar que eu era uma louca drogada e ainda dormindo no mesmo quarto de todo mundo. Agora vocês entendem porque eu não fui jantar ontem e porque eu não lembro o nome de ninguém, certo? Então vocês podem se apresentar de novo?”

A história se espalhou por todo hostel e as pessoas entravam no nosso quarto só para conhecer o cara da happy pizza! Pois é, o Shin teve seus 2 ou 3 dias de fama. Saímos para jantar aquela noite – eu, Ryoko, Morgan, Wei e o Yogie, um indonésio que tinha acabado de chegar e estava no quarto da Wei. O Shin ficou dormindo. Ficamos todos curiosos por essa tal pizza e fomos lá conhecer.

Antes que fique a imagem errada do lugar, o restaurante tem pizzas comuns. Se você quer a pizza com maconha tem que pedir para o garçom que ela seja extra happy, se não falar nada vai vir apenas uma simples pizza. A Morgan disse que tinha tido happy pizza suficiente para aqueles dois dias, então pedimos uma normal e uma extra happy. Acho que foi pela pouca quantidade (2 pedaços para cada), mas ninguém sentiu muito os efeitos. Só o Yogie que começou a ver sardas pulando da cara das pessoas, mas não foi nada de mais.

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Nós e a happy pizza

Para deixar claro, o Shin ficou bem e começou a fazer piadas dele mesmo no dia seguinte. Essa história da pizza nos uniu e em apenas 5 dias eu sai de Siem Reap com a sensação de que estava deixando lá meus melhores amigos de infância. Hoje está cada um em seu país e agradeço ao Facebook que, mesmo com todos seu pontos negativos, me mantém em contato com os amigos de viagem. Lembra que eu disse que a Ryoko mora em Bangkok? Foi pra casa dela que eu fui quando passei pela cidade 🙂 .

 

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